terça-feira, 8 de dezembro de 2009

No âmbito dos 16 dias de activismo contra a violência baseada no género (GBV)

Uma Reflexão sobre a questão da violência doméstica contra a mulher em Moçambique

Por: Delfina Celeste Dança
- Focal Point para questões do Género no Centro de Estudos Moçambicanos e Internacionais (CEMO)

A Constituição da República de Moçambique define, no seu artigo 35, que “ todos os cidadãos são iguais perante a lei, gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres, independentemente da cor, raça, sexo, origem étnica, lugar de nascimento, religião, grau de instrução, posição social, estado civil dos pais, profissão ou opção politica”.
Apesar de estar assim plasmado na constituição, em Moçambique a questão da igualdade de género continua um mito. Nos vários domínios da vida social, politico, económico e cultural, a mulher ocupa quase sempre um lugar irrelevante.

Alguns dos casos mais marcantes dessa desigualdade consubstancia-se na Violência Doméstica contra a mulher.
Violência doméstica é a violência, explícita ou velada, literalmente praticada dentro de casa ou no âmbito familiar, entre indivíduos unidos por parentesco civil (marido e mulher, sogra, padrasto) ou parentesco natural pai, mãe, filhos, irmãos etc. Inclui diversas práticas, como a violência e o abuso sexual contra as crianças, maus-tratos contra idosos, e violência contra a mulher e contra o homem geralmente nos processos de separação litigiosa além da violência sexual contra o parceiro.

Ela pode ser dividida em violência física — quando envolve agressão directa, contra pessoas queridas do agredido ou destruição de objectos e pertences do mesmo (patrimonial); violência psicológica — quando envolve agressão verbal, ameaças, gestos e posturas agressivas, juridicamente produzindo danos morais; e violência socio-económica, quando envolve o controle da vida social da vítima ou de seus recursos económicos

Dados estatísticos apontam que a violência contra a mulher é maior do que contra o homem. A violência doméstica assume várias formas e há uma elevada incidência no seio da sociedade moçambicana e as afectadas por esta violência estão entre os membros discriminados pelas relações sociais de género (mulheres de todas as idades);

Em Abril deste ano, o Procurador-geral da República, Augusto Paulino, apresentando o seu informe ao Parlamento, destacou que “em Moçambique foram registados mais de 14 mil casos de violência doméstica no ano passado sendo que 9.224 incidiram sobre as mulheres, mais quatro mil casos comparativamente ao ano de 2007.
Para este ano, a situação não foi melhor. Vejamos alguns casos reportados nos jornais nacionais , só no início deste ano, sobre a violência contra a mulher:

1. “T3 – marido matou a esposa à catanada”
"Uma mulher cujo nome não foi possível colher perdeu a vida vítima de esquartejamento, num acto cometido pelo próprio marido, alegadamente para reivindicar o facto de esta não ter regressado de uma festa aonde tinha ido com um grupo de amigas. (...) Informações da PRM através do Comendo Provincial de Maputo, indicam que tudo começou no último domingo quando a malograda foi a um encontro de comadres, vulgarmente chamado xitique, não tendo regressado na data prevista".
Fonte: Notícias, 5/02/2009


2. “Agressor ameaça família da jovem espancada”
"A família da jovem que foi espancada pelo namorado, de nome Silvestre Bila, diz que está a ser alvo de ameaças do mesmo, apesar de já se encontrar detido na 3ª esquadra da PRM a nível da cidade de Maputo. (...) Segundo informações do pai da vítima, Silvestre Bila terá espancado a namorada usando um descodificador de televisão. O golpe foi repetido cem vezes, segundo o laudo médico, facto que causou graves ferimentos à vítima nas mãos e na cabeça, porque a mesma terá usado os seus braços para proteger a sua cabeça dos fortes golpes desferidos pelo agressor.
Referir que Silvestre Bila não só espancou a sua namorada, como também ao jovem que suspeita ser amante da vítima e seus pais. (...)"
Fonte: O País, 18/02/2009


3. “Mais um jovem espanca violentamente sua parceira”
O suposto agressor está sob custódia policial
"Um jovem que responde pelo nome de Pedro Fernando, de 23 anos de idade, espancou violentamente uma cidadã (...), por sinal sua esposa [mãe de dois filhos], residente no bairro Albazine, arredores da cidade de Maputo. (...) A fonte conta que a acção criminosa deu-se na localidade de Panjane - distrito de Magude, agressão esta que resultou num grave trauma facial.
Segundo a vítima, o suposto agressor apoderou-se, após a agressão, de um valor monetário estimado em cerca de 5 mil meticais, um telemóvel e uma pasta contendo algumas peças de vestuário pertencentes ao filho de 3 anos de idade, que na altura dos golpes se encontrava na companhia da mãe".
Fonte: O País, 20/02/2009

O exacerbar de casos iguais a esses, um pouco por todo o país, e perante o olhar impávido do autoridades governamentais com competência para agir e não o fazendo, fez com que as organizações da sociedade civil que lutam pelos direitos humanos da mulher em Moçambique travassem uma luta árdua para fazer passar no parlamento nacional a Lei Contra a Violência Domestica.

Considerando que no nosso país não existe nenhum dispositivo legal que penalize como crime tipificado a violência doméstica e que o problema se apresenta com características de gravidade e de forma crescente, as Organizações da Sociedade Civil apelaram para que a proposta de Lei Contra a Violência Doméstica ora depositada no Parlamento moçambicano, seja discutida, aprovada e promulgada no decurso da Sessão; Que não sofra consideráveis alterações de conteúdo, ou seja, que se respeite o espírito do proponente; e Que a Violência Doméstica, em particular a Violência Contra a Mulher, faça parte da agenda dos governantes, legisladores e aplicadores da Lei em Moçambique.

Após muito tempo de luta para que o Parlamento moçambicano discutisse e aprovasse a lei sobre a violência doméstica, tal ocorreu, finalmente, a 21 de Julho de 2009, como refere uma fonte da Lusa,

“O Parlamento moçambicano aprovou, “por consenso e aclamação”, a Lei sobre a Violência Doméstica contra a Mulher e Criança, que estipula o afastamento do agressor do lar, dando legitimidade de denúncia a qualquer pessoa, incluindo não familiares.

Embora tenha sido aprovada pelas duas bancadas do Parlamento moçambicano, a lei provocou muita polémica, com os deputados da Renamo denunciando o carácter discriminatório da legislação, por apenas proteger mulheres vítimas de violência doméstica.

Três dias após o adiamento da aprovação por falta de unanimidade, a Assembleia da República de Moçambique ratificou o documento denominado Lei sobre a Violência Doméstica contra a Mulher e Criança, ampliando a protecção ao homem. Maputo, 21.07.09

Contudo, a luta da mulher moçambicana para fazer valer seus direitos, mesmo depois da lei aprovada, continua muito difícil, pois vivemos numa sociedade marcadamente machista, em que o domínio do homem sobre a mulher é símbolo de poder. Em que a mulher é tida como um objecto ao serviço do homem, e muitos outros casos iguais a estes se tem assistido nesta mesma sociedade.

Em suma, a questão dos direitos da mulher em Moçambique tem vindo a melhorar significativamente, sobretudo com a elevação da mulher para ocupar lugares cimeiros, cargos políticos importantes, na tomada de decisão sobre questões importantes na vida do país.

A LUTA CONTINUA MULHERES! A UNIAO FAZ A FORÇA!

Referências:

- Assembleia da Republica (2004): Constituição da Republica de Moçambique; Imprensa Nacional de Moçambique: Maputo.
-http://pt.wikipedia.org/wiki/Viol%C3%AAncia_dom%C3%A9stica#cite_note-0#cite_note-0

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